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Na rotina do ciclista, tiroteio, veículos incendiados e armas. Não, não é na Síria


Todo dia ele pedala 50 quilômetros para ir e voltar de casa para o trabalho. No trajeto, cruza zonas de conflito e vê, a bordo da bicicleta, cenas de guerra. Admite que sente medo, mas se recusa a desistir do meio de transporte e do estilo de vida que escolheu. Até porque mudar não não lhe garante estar a salvo da violência que o cerca.

O técnico em telecomunicações, de 23 anos, seis deles pedalando no trânsito, já testemunhou tantos tiroteios que perdeu as contas. Passou por ônibus incendiados e manchas de sangue pelo chão. Testemunhou a tensão de militares armados com fuzis e temeu ser alvo de bala perdida. Pode parecer, mas Rodrigo Souza não vive na Síria, na Líbia ou em outro país em guerra. Ele mora na Penha, subúrbio do Rio de Janeiro, e trabalha na Barra da Tijuca, Zona Oeste da cidade. Na rotina de Rodrigo, a insegurança é sempre uma certeza. De bicicleta, acaba servindo como retrato 3x4 do carioca, um personagem que resume o dia a dia assustador de milhares de moradores do Rio, pedalem ou não.

“Meu caminho da Penha à Barra é todo perigoso (na foto acima, feita por Rodrigo, marcas de sangue no asfalto e, à direita, homem no chão, com PMs apontando armas para ele). Já passei por tiroteios em todos os lugares. Em Vaz Lobo, Madureira e Tanque foram ônibus do BRT queimados e depredados pela população, em protesto contra violência que eles atribuem à polícia. Na Cidade de Deus, já estou até acostumado a ver o caveirão (blindado da PM) e a rua principal fechada pelos policiais. Tiroteios, perdi a conta”, enumera o ciclista.

O sufoco maior foi exatamente na Cidade de Deus, comunidade na região de Jacarepaguá. O som dos tiros parecia ser ao lado dele. A adrenalina subiu tanto que se transformou em combustível nas pernas. A bicicleta voava baixo.

“Teve um dia em que eu estava passando pela Cidade de Deus e escutava os tiros. Parecia muito perto mesmo. Pensei ‘Meu Deus, eu estou passando no meio do tiroteio!’ Passei muito correndo. Depois eu vi no Strava (aplicativo que funciona como GPS e monitora a distância percorrida) a velocidade em que pedalei, e vi que tinha ido a mais de 40 km/h! Eu pedalei muito, muito rápido, porque os tiros estavam próximos demais. Foi a vez em que senti mais medo”.

O susto mais recente ocorreu há dois dias: “Foi na Praça Seca (também em Jacarepaguá). A polícia estava perseguindo um carro. Daí eu só vi na hora que o carro parou e saíram da viatura dois PMs apontando fuzis para o tal carro. Fui embora sem nem olhar para trás”, conta.

Pai de uma menina de sete meses, Rodrigo teme pela própria vida. Mas não aceita se render ao terror.

“Eu fico preocupado, claro. Imagina eu sair de casa e uma bala perdida me achar por aí. Dois amigos próximos a mim já desistiram de ir de bicicleta para o trabalho por causa da violência, e aí falo da questão de assalto e tiroteio e da violência no trânsito, fechadas e atropelamentos. Eu fico triste em ver amigos desistindo e penso nisso, mas eu adoro pedalar, odeio pegar ônibus. Imagina eu desistindo de pedalar? De ônibus é uma hora e meia de percurso, e de bicicleta são 50 minutos. Bicicleta é um adianto, eu chego mais cedo e mais disposto ao trabalho. Fico chateado só em pensar na possibilidade de abrir mão disso por causa da violência”.

Rodrigo conta que já sofreu, num mesmo episódio, os dois tipos de violência que citou. Atingido por um carro que trafegava na contramão e ferido com um corte na perna em que precisou levar 30 pontos, teve o GPS da bicicleta roubado enquanto estava no chão. Foi vítima do trânsito e de um ladrão ao mesmo tempo.

“O ser humano se acostuma a tudo, e, infelizmente, eu já me acostumei com a ideia de que posso sair de casa e alguém pode querer me atropelar ou assaltar e que provavelmente vou passar por um tiroteio. Antes eu procurava informação para saber como estariam as coisas. Agora saio sem saber de nada, e conforme vão acontecendo as coisas eu vou mudando meu percurso”.

Testemunha da violência cotidiana do Rio, Rodrigo pedala sempre com duas câmeras, uma no suporte de peito e outra na bicicleta, apontada para trás. Os vídeos, coloca no You Tube. É um cronista da cidade, com as imagens que registra e as vivências que acumula.

“Já fui de bike de Florianópolis, em Santa Catarina, a Punta Del Este, no Uruguai. Em 11 dias de estrada não vi nada de violência. Em dois dias de bike pelo Rio acontecem milhões de coisas”, compara.

VEJA VÍDEOS DE RODRIGO

"Passando pelo tiroteio no Tanque"

"Passando após tiroteio entre bandidos e fuzileiros navais"

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